Os três meses de afastamento por lesão mexeram com a cabeça de Falcão. Foram dúvidas e incertezas sobre o seu futuro nas quadras e uma quase cirurgia, que poderia colocar em risco o decorrer da sua carreira. Passado o susto, o craque já pode levantar a cabeça e olhar para o futuro. E o futuro passa pela certeza de disputar mais um Mundial. Se no ano passado, o camisa 12 havia falado que tinha 40% de chances de jogar a Copa do Mundo de 2016, hoje as suas perspectivas são bem mais otimistas. Respaldado pela ainda inabalável técnica acima da média, Falcão reconhece que não imaginava chegar aos 38 anos em plena atividade. Entretanto, ele afirma que o excesso de compromissos pessoais, com negócios e patrocinadores, tem o atrapalhado.

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– É o que eu sempre falo, enquanto os outros jogadores acabam uma partida e vão para casa ficar com a perna esticada vendo filme no sofá, eu estou viajando ou tendo algum compromisso, e quando chego de volta já tenho que treinar, sem ter aquele período de descanso – ressaltou.

Em entrevista ao GloboEsporte.com, em Fortaleza, o maior jogador de futsal de todos os tempos falou ainda sobre a chance dada à nova diretoria da Confederação Brasileira de Futebol de Salão (CBFS), sobre a motivação de continuar buscando resultados mesmo sendo um atleta consagrado e sobre uma tentadora proposta do futsal dos Estados Unidos, seu provável destino a partir de 2017. Falcão participou, nesta terça-feira, da vitória da seleção brasileira sobre Portugal por 2 a 1, em amistoso internacional realizado na Arena Castelão. Os gols do Brasil foram marcados pelo ala Xuxa e pelo goleiro Tiago, com Cardinal descontando para os portugueses. Confira a entrevista:

GloboEsporte.com: No ano passado, você havia falado que só em 2016 saberia se teria condições de disputar o Mundial do ano que vem e que naquele momento, as suas chances de estar na próxima Copa do Mundo eram de 40%. Ainda mantém o mesmo pensamento?

Falcão: Não esperava chegar a um ano do Mundial em plenas condições. A motivação continua. O que eu tive agora foi uma lesão, um acontecimento que poderia ter ocorrido comigo em qualquer idade. A minha vontade de jogar é o que mais importa, então tenho certeza que ano que vem será um ano especial. Vou tentar prevenir as lesões para que eu chegue no Mundial da melhor maneira possível.

Na partida contra o Corinthians pela Liga Paulista, na última semana, você falou que ainda sentia dores no joelho. Sentiu dores no jogo contra Portugal nesta terça-feira? Já está 100% recuperado da lesão que o afastou da quadra por três meses?

Tem o resquício. Tem o medo. A forma física ainda não é ideal, mas queria participar dessa partida. Participei. Não foi do jeito que eu queria, mas valeu. Pelo menos, estive presente aqui em Fortaleza. Agora é recuperar o psicológico, porque a perna está boa, mas a cabeça ainda não. Não venho sentido dores, apenas alguns estalos, e os médicos já falaram que eu tenho que conviver com isso. Não é fácil, porque às vezes eu tomo uma injeção, que faz com que eu não sinta nenhuma dor, mas aí eu paro, e a dor volta. Então preciso recuperar isso, principalmente no lado psicológico.

Nesses seus três meses de inatividade, você chegou a temer pelo pior, talvez até pela continuidade da sua carreira?

Cheguei e pensar que era uma lesão cirúrgica. Os médicos em alguns momentos chegaram a preferir a cirurgia, eu tentei segurar, porque sempre acreditei que poderia me recuperar sem a operação. Felizmente tudo correu bem e hoje estou aqui novamente. Espero agora ter uma sequência boa, que esse incômodo vá sumindo e que eu possa finalizar o ano da melhor maneira possível para entrar 2016 com 100% das minhas condições.

Você é um jogador que tem muitos compromissos e atividades fora das quadras, como a sua atuação como empresário e seus eventos com patrocinadores pessoais. Acha que isso atrapalha a sua carreira? Se você tivesse mais tempo para você mesmo, o tratamento de uma lesão, por exemplo, poderia ser bem mais simples?

Atrapalha sim, com certeza. É o que eu sempre falo, enquanto os outros jogadores acabam uma partida e vão para casa ficar com a perna esticada vendo filme no sofá, eu estou viajando ou tendo algum compromisso, e quando chego de volta já tenho que treinar, sem ter aquele período de descanso. Isso em certos momentos acaba atrapalhando, principalmente quando afunilam os jogos misturando com os compromissos. Você tem que jogar, treinar e recuperar. Eu não consigo ter isso, mas estou me organizando para que isso não aconteça principalmente no ano que vem.

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Você tem muitos títulos na carreira e um reconhecimento internacional por tudo o que você representa para o futsal e para o esporte. O que te motiva a continuar nessa rotina sacrificante de atleta, com muitas competições, treinos e viagens?

A vida de atleta é muito curta e você tem que aproveitar cada momento. Quando você fala em parar é mudar totalmente a sua rotina de 30 anos de vida. Tenho essa preocupação, então espero aproveitar o máximo possível enquanto eu estiver me sentindo em condições de jogar.

Você recebeu recentemente uma proposta para jogar no futsal dos Estados Unidos. Ainda está disposto a aceitá-la?

A proposta seria para começar em 2017. Eles me chamaram para ser um parceiro da liga, os proprietários da liga me ofereceram uma espécie de sociedade, participando da tomada de decisões, como calendário e etc. Hoje posso dizer que sou um parceiro deles e posso dizer que faz parte dos meus planos pessoais ir para os Estados Unidos, porque lá com certeza eu jogaria mais uns dois ou três anos e seria uma coisa mais de exibição e divulgação do esporte.

Você liderou um movimento dos principais jogadores do país por melhorias no futsal brasileiro, chegando criar um boicote às convocações da seleção. Como está agora a relação com a CBFS? As diferenças entre atletas e dirigentes foram zeradas?

A CBFS vem pegando os resquícios das outras gestões, mas o mais importante disso tudo é que eles deram espaço para os jogadores opinarem e discutirem questões referentes aos atletas. Então tudo está muito claro para nós, então foi essa a contrapartida para que as coisas andassem da melhor maneira possível, então hoje jogadores e CBFS têm os mesmos interesses. Eles entenderam que a nossa intenção sempre foi em benefício do futsal e não em benefício próprio, e parece que agora eles estão querendo andar. A dificuldade é grande, o rombo é enorme, mas a gente espera que as coisas se resolvam principalmente para o ano que vem quando esperamos que a gente consiga se reunir pelo menos uma vez por mês para chegar preparado para o Mundial.

Como a seleção brasileira ficou dez meses parada, você acha que hoje o Brasil está abaixo das demais potências do futsal como Espanha, Itália e Rússia?

Estamos abaixo sim, porque todas essas seleções estão se preparando há três anos para jogar a Copa do Mundo. Se a partir de agora a gente se organizar, nós vamos ter um ano só para se reunir. Hoje mesmo a gente está aqui com a seleção, mas só com jogadores do Brasil. Temos que mudar um pouco a filosofia, mas para isso precisa de dinheiro e patrocínio e isso hoje a CBFS ainda não tem. Portanto, estamos montando um calendário especial para o ano que vem para buscar recuperar esse ano perdido, isto é, vamos nos reunir mais do que as demais seleções, o que pode fazer a diferença na nossa preparação.

O que achou do jogo contra Portugal e, mais especificamente do evento em si, que foi a segunda partida da seleção em uma arena de futebol, com promessa de quebra de recorde de público, o que acabou não se concretizando?

Numa terça-feira às 21h30 a gente saberia que seria difícil ter aquele público do ano passado no Mané Garrincha (56 mil). O importante é que esse tipo de evento já é um sucesso. É gostoso, diferente, a aceitação foi muito boa e a gente espera que aconteça mais vezes.

 

O que você acha que vai ser do futsal quando o Falcão encerrar a carreira?

A gente tem que tomar cuidado com essa resposta para não parecer egocêntrico. Tenho que falar uma coisa real. Todo mundo se preocupa com isso, tenho ouvido opiniões de jogadores, que não têm vaidade em falar, e de diretores sobre a minha aposentadoria. Sei do retorno de mídia que eu tenho e sei também que não esporte vive sem ídolos. Então espero que apareçam outros ídolos, outras referências em relação a público, porque o futsal não é um esporte tão visto quanto o futebol, então você precisa de divulgação. E eu sempre tive isso na minha carreira, o que atrai público para o estádio e ginásio. Quando eu parar eu espero que tudo continue de uma certa maneira, que surjam ídolos e que os patrocínios continuem. Eu avalio pelas redes sociais, onde tenho muito mais seguidores que os outros jogadores. Isso para o Falcão é bom, mas para o futsal é melhor a gente sempre tentar interagir com os outros para que seja melhor para o nosso esporte.

Notícias: Flávio Dilascio/ Thaís Jorge
Imagens: Zerosa Filho/ CBFS/ Thaís Jorge