Franklin a serviço da Seleção Brasileira

Franklin D. Roosevelt fez mais pela defesa americana do que qualquer presidente dos EUA ao longo da história. Ele combateu a Grande Depressão com o New Deal curativo e ajudou a acabar com a guerra mais mortal da história. Fundamental para este último foi um telefonema entre Roosevelt e o primeiro-ministro britânico Winston Churchill – um telefonema possibilitado por um sistema de labirinto para impedir interceptadores. SIGSALY, tecnologia de ponta, digitalizou a voz humana e, utilizando chaves criptográficas, transformou-a novamente via vocoder. Um terminal estava escondido no Pentágono e equipado com uma extensão para a Casa Branca. O outro estava escondido no porão da loja de departamentos Selfridges e equipado com uma extensão para o número 10 da Downing Street. Outra história maluca por telefone ajudou Franklin Roosevelt a fazer maravilhas pela defesa brasileira. Se FDR “se levantou de uma cadeira de rodas para erguer a nação de joelhos”, o seu homónimo levantou-se de um banco do Maracanazinho para erguer a sua nação aos céus. Quando a final da Copa do Mundo de Futsal da FIFA, há 15 anos até hoje, foi para os pênaltis, Franklin Roosevelt Bueres Junior – sua avó era uma grande fã do político americano – canalizou seu Gunter Netzer interior, criou coragem e contou ao seu rabugento técnico PC de Oliveira, com quem estava em desacordo, que estava seguindo. O nativo de Osasco justificou sua decisão ao emergir como o salvador dos pênaltis, salvando duas cobranças de pênalti para coroar o Brasil pela primeira vez em 12 anos. Franklin compartilha sua história alucinante com a FIFA.

Indo para a fase final de 2008, o Brasil ficou sem o grande Manoel Tobias pela primeira vez em 19 anos, a Espanha conquistou títulos mundiais consecutivos, tendo superado o Brasil em ambas as ocasiões, e contou com jogadores magníficos como Luis Amado, Kike Boned e Javi Rodríguez. Foi consenso que a Espanha se tornou rei do futsal?

Em primeiro lugar, a Espanha tinha uma equipa magnífica. Eles tinham individualidades incríveis e, principalmente, jogavam muito bem juntos, taticamente e tecnicamente. As principais equipas europeias estão sempre num outro nível neste aspecto. Sabíamos que seria muito, muito difícil vencer a Espanha. Talvez outros achassem que tinham vantagem, mas pessoalmente senti que tínhamos algo que eles não tinham: o apoio. Penso que tivemos um excelente treinador, grandes jogadores, jogámos muito bem como equipa e os adeptos fizeram a diferença.

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Espanha na Copa do Mundo de 2008

O Brasil teve uma sorte terrível com lesões durante toda a competição…

Você não pode controlar lesões. Numa Copa do Mundo você tem tantos jogos intensos e de alta pressão – um após o outro. Sofremos uma lesão, depois outra, depois outra. Quando o Falcao se lesionou – só conseguiu jogar alguns minutos na final – o PC já nos tinha preparado. Tivemos que permanecer totalmente focados. O que isso significou foi que todos os outros, apesar de alguns jogadores terem sofrido pancadas e terem jogado mais minutos do que estavam habituados, tiveram que dar um passo à frente e dar um extra. Todos partilhávamos a mesma mentalidade: vamos fazer o que for preciso para ultrapassar este obstáculo e conquistar o título mundial.

Foi pré-combinado que se um jogo do Brasil fosse para os pênaltis, você iria para os pênaltis?

(risos) O que aconteceu foi uma loucura. Já fui goleiro titular na Copa do Mundo. Tiago não tinha. Na sua primeira Copa do Mundo você simplesmente não dorme. Não que eu tenha dormido muito bem, porque havíamos perdido as duas últimas Copas do Mundo para a Espanha, mas estava menos ansioso que o Tiago. Não tínhamos permissão para usar telefones celulares e os telefones de nossos quartos estavam todos desligados porque PC queria que estivéssemos 100% concentrados. Eu estava morando com o Tiago. Nosso telefone não tocou o tempo todo, mas de repente tocou. Nós dois olhamos para ele, intrigados, e eu disse: ‘Por favor, responda’. Ele fez e disse: ‘Franklin, é para você’. As pessoas não sabem disso, mas o PC ficou chateado comigo porque eu não tinha ido jogar no time dele, o Ulbras. Ele nem falava comigo nos treinos – apenas quando era absolutamente necessário na quadra. Era um cara chamado Wagner com quem, quando toquei na Itália, conversei pelo Messenger. Ele descobriu em que hotel estávamos hospedados e, não tenho ideia de como, mas conseguiu entrar em contato com o quarto. Ele disse: ‘Sinto muito incomodar você, mas tem uma mulher aqui que quer falar com você’. Achei muito estranho ele ter conseguido passar, então disse: ‘Ok, sem problemas’. Era uma mulher que fazia trabalho voluntário na favela. Ela disse: ‘Olha, eu não te conheço, não sei nada sobre o esporte que você pratica, mas sonhei com você nas últimas duas noites. Sonhei que amanhã você seria usado por Deus.’ Eu falei: ‘Mas nem vou jogar, o Tiago vai estar no gol’. Ela insistiu: ‘Amanhã você será usado por Deus’. Assim que desliguei o telefone, o Tiago virou-se para mim e disse: ‘Franklin, nos treinos vi como você está defendendo pênaltis. Se for para os pênaltis, você não quer ir para o gol?’ Meu pensamento imediato foi que não estaria aquecido, que não estaria no ritmo de parar os golpes. Mas por causa do que a mulher me contou, eu disse: ‘Ok, eu faço isso’. Então pensei: ‘Droga, como vou contar isso ao PC? Ele já está bravo comigo’.

Como você se sentiu durante o jogo?

Normalmente, quando você é goleiro reserva, você fica relaxado no banco. Mas porque a mulher me disse que eu seria usado por Deus, fiquei totalmente concentrado. Eu realmente não queria continuar, estava desesperado para vencermos sem mim, mas acreditei que de alguma forma acabaria seguindo. Estava com medo de ter de contar ao PC, mas quando a Espanha empatou, levantei-me, criei coragem e disse-lhe: ‘Se for para os penáltis, vou continuar’. Ele olhou para mim, chocado e zangado, e disse: ‘Ah, é?’ Ele me chamou de todos os palavrões possíveis! (risos). Ele não me impediu, no entanto. Teria sido fácil me impedir. Eu estava no time porque o PC me avaliou e confiou em mim. Assim que soou o apito final, o Tiago correu até mim para eu continuar. Eu ainda podia ouvir o PC me xingando! Eu falei: ‘Thiago, dá uns chutes em mim, preciso sentir a bola’. Ele fez isso e eu continuei correndo.

O Brasil havia perdido as duas últimas Copas do Mundo para a Espanha, o Maracanazinho estava lotado de brasileiros apaixonados pelo futsal, você arriscou a ira do PC… deve ter sentido o peso do mundo nos ombros?
Serei totalmente honesto com você: se fosse apenas Franklin, considerando tudo o que você acabou de dizer e o fato de minha família estar toda lá, não acho que estaria à altura. Mas por causa do que aquela mulher me disse, eu sabia que Deus estava comigo. Quando defendi o pênalti de Torras, pensei: ‘Graças a Deus seremos campeões mundiais’. Ari foi o nosso melhor batedor de pênaltis – por isso ele foi o último. Quando o Ari errou, voltei para o gol, abri os braços e falei: ‘Deus, faz a bola me bater’. E uma loucura: ela ajudou o Brasil a ganhar a Copa do Mundo, mas nunca conheci a mulher que me ligou. Talvez se ela ler isso ela entrará em contato.

Como foi se tornar campeão mundial?
Eu tenho arrepios agora só de pensar nisso. Uau. É difícil até colocar em palavras. Vindo de onde venho, ser campeão mundial é altamente improvável. Foi uma sensação de grande alívio – o Brasil não ganhava a Copa do Mundo há 12 anos e estávamos jogando diante do nosso povo, não queríamos desesperadamente decepcioná-lo – uma alegria indescritível. Foi um momento celestial.

Como foram as comemorações depois?
Primeiro – nunca vou esquecer disso – assim que entramos no camarim, o PC nos reuniu. Ele disse: ‘Nós nos dedicamos e treinamos o máximo possível. Assistimos milhares de vídeos. Nós suamos além dos limites das possibilidades. Apesar de tudo isto, só conseguimos vencer a Espanha nos pênaltis. Se quisermos voltar a vencer a Espanha, teremos que fazer ainda mais’. Acho que foi fundamental para vencermos a próxima Copa do Mundo. PC era um gênio. Depois disso as comemorações foram inesquecíveis. Nós fomos para um restaurante. Éramos nós jogadores, a comissão técnica, nossas famílias, as equipes de TV e o Ronaldo Fenômeno! Ronaldo Fenômeno, que é um ícone para todos nós, ficou emocionado. Você pode imaginar como isso nos fez sentir? Entrei no restaurante com minha esposa, ele se aproximou, me deu um grande abraço e disse: ‘Franklin, preciso tirar uma foto com você’. Eu disse: ‘Você está brincando comigo!? Sou eu quem precisa tirar uma foto com você! Ele é um cara tão humilde e foi muito legal com todos nós.

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Jogador foi diversas vezes campeão com a Seleção

O que você achou do Falcão como jogador?
Ele estava em um nível diferente. Ele fez coisas que nenhum outro jogador de todo o mundo poderia fazer. Ele tinha uma habilidade que estava fora do comum. Ele tinha um talento fenomenal. Quando ele jogava no time, eram necessários dois, três jogadores para igualá-lo. Falcão preparado, focado e jogando pela equipe – somado ao seu talento fenomenal – foi imparável. Estou muito grato por ter jogado ao lado do Falcão.

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Falcão comemorando mais um gol pela seleção

Você está confiante de que o Brasil poderá reconquistar o título da Copa do Mundo de Futsal da FIFA no próximo ano?
Acho que o futsal mudou. Acho que antes tínhamos estrelas que estavam em um nível completamente diferente dos demais: Manoel Tobias, Falcão, Kike. Acho que hoje em dia está mais equilibrado. Muitas equipes têm muitos jogadores de qualidade. Fiquei impressionado com o crescimento do Brasil nos últimos anos. Acredito que podemos conquistar o título, mas também é extremamente difícil hoje em dia. No passado você tinha Argentina, Portugal sempre acertando a trave [chegando perto de levantar troféus], mas agora eles estão conquistando títulos. O Irão é outra equipa que sempre teve jogadores fantásticos e tem potencial para vencer.

Quem você acha que é o melhor goleiro do mundo atualmente?
Guita. Ele não é apenas um excelente goleiro, mas também tem algo que eu não tinha: é ótimo com os pés.

Finalmente, seus dois filhos se tornaram atletas profissionais. Você acha que o futsal os ajudou nisso?
Acho que os dois entraram no esporte por causa do futsal, por causa da minha história. Acho que está no DNA deles. Matheus é tenista profissional, já esteve no ATP [Tour]. Ele tem apenas 20 anos. E Giovane é jogador profissional de tênis de praia. Ele jogou futsal, treinou comigo. Devolver um tiro é como salvar um tiro.