Larissa Pelarin veio em direção à reportagem do ge ao fim do treino de futsal. No bate-papo antes da entrevista, destacou: “fiz seis gols hoje”. A máscara escondia o sorriso, mas o olhar transmitia a satisfação pelo desempenho. Satisfação de quem ama esporte e sabe que treinar bem é o caminho para alcançar o que sonha.

Danilo Sardinha

Larissa, de colete azul, no treino da equipe ProSporT21 Futsal Down, de São José dos Campos. Foto: Danilo Sardinha

Aos 25 anos, Larissa deseja chegar à seleção brasileira. Treina quinzenalmente no ProSporT21 Futsal Down, um time de futsal para pessoas com síndrome de Down em São José dos Campos, interior de São Paulo. O projeto é gratuito e aberto para crianças, jovens e adultos do município joseense e da região do Vale do Paraíba.

O foco do projeto é proporcionar às pessoas com síndrome de Down os benefícios da prática de esporte, como o aperfeiçoamento de habilidades motoras, o condicionamento físico e a socialização. Larissa, que coleciona medalhas na natação e no atletismo, tem o perfil de atleta. Gosta de estar ali também por causa de outro benefício: ser um local que dá a possibilidade de buscar os sonhos.

– Quero chegar no profissional mesmo, fico imaginando a seleção brasileira. Gosto muito da Marta, me inspiro nela. (…) Gosto de estar aqui, de treinar, de fazer gols e fazer dancinha na comemoração (risos) – contou Larissa Pelarin.

Danilo Sardinha

Larissa Pelarin durante treino do ProSporT21 Futsal Down. Foto: Danilo Sardinha

O projeto social

O projeto é destinado para pessoas com síndrome de Down a partir dos seis anos. Os treinos ocorrem a cada 15 dias no Centro de Treinamento ProSport, no Residencial União, zona sul de São José dos Campos. São 32 inscritos, mas, por causa da pandemia, são cerca de 15 que têm ido às aulas. A ideia é aumentar o número de participantes e começar disputar jogos contra outras equipes.

As turmas são separadas por idades. A primeira é para crianças entre seis e 12 anos. Depois, todos a partir dos 13 anos. As atividades ocorrem seguindo os protocolos de segurança para a prática de atividades coletivas na pandemia.

Danilo Sardinha

Treino para crianças da equipe de São José dos Campos. Foto: Danilo Sardinha

Lorenzo, de seis anos, divertia-se bastante durante o treino acompanhado pela reportagem do ge. A cada atividade realizada, um sorriso se abria. Sorrisos que eram acompanhados pelo pai, Daniel Baggio.

– Ele sempre gostou muito de esportes, gosta de fazer exercícios. Pensamos que ele poderia gostar e, realmente, ele gostou bastante mesmo. A gente só fala que vamos jogar futebol, ele fica todo feliz. Ele já veio quatro vezes. Vejo que desenvolve bastante a parte motora dele. E a parte social, de ver os amigos – destacou Daniel.

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Lorenzo com voluntária do projeto durante treino da equipe de São José dos Campos. Foto: Danilo Sardinha

Os treinos são ministrados por profissionais de educação física. Todos ali são voluntários. A educadora física Sheila Bueno é a coordenadora do centro de treinamento e ressalta a importância do esporte para pessoas com síndrome de Down.

– A gente acredita muito no esporte como transformação. Trabalhamos toda a parte física, no condicionamento. Essa parte bem específica mesmo, do cognitivo. Essa boa parte que conseguimos desenvolver neles, como coordenação motora, agilidade, flexibilidade, equilíbrio, que é uma dificuldade para eles – disse.

– Tudo o que eles fazem costuma ser individual. Fisioterapia é individual, terapia… Com o futsal, conseguimos trabalhar essa parte de socialização – acrescentou Sheila.

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Turma infantil do ProSporT21 Futsal Down, time de São José dos Campos. Foto: Danilo Sardinha

Para participar do projeto, que é gratuito, é preciso apresentar laudo médico e raio-x da cervical, que autoriza a prática esportiva, e preencher uma ficha de inscrição (clique aqui).

Uma ideia que virou realidade

Enquanto Larissa e Lorenzo treinavam, à beira da quadra estava a cientista da computação Marinalva Soares acompanhando a atividade. Ela foi quem idealizou o projeto em São José dos Campos. Se o olhar de Larissa brilha pelos gols, o dela brilha em ver a realização do que planejou.

Danilo Sardinha

Sofia, filha de Marinalva Soares. Foto: Danilo Sardinha

Marinalva é mãe de Sofia, de sete anos, que tem síndrome de Down e é uma das alunas do projeto. Em 2019, ela foi a um evento de Maurício Carvalho, coordenador da Ponte Preta Futsal Down, de Campinas. A palestra apresentava os benefícios do futsal para pessoas com síndrome de Down.

– É encantador. Não tem como você não se mexer, porque é encantador. Falei: “vou criar um time aqui”. Mas eu não tinha contato com ninguém da área do esporte. Sou cientista da computação. Comecei perguntar para os colegas do trabalho se conheciam alguém da área de futsal. Me passaram o telefone da Sheila (Bueno, do centro de treinamento) e entrei o contato. Fiquei com receio, porque é um projeto voluntário. Temos famílias de várias classes sociais e as famílias já têm um gasto absurdo com terapias… Pensei ”será que vão aceitar?”. Para minha surpresa, eles abraçaram – contou.

Danilo Sardinha

Treino da equipe de futsal down de São José dos Campos. Foto: Danilo Sardinha

O projeto teria início em 7 de março de 2020, quando acertaram os detalhes. Porém, logo depois, a pandemia foi decretada e os treinos foram adiados. Somente em setembro ocorreu o primeiro. Em janeiro deste ano, diante do aumento de casos de Covid-19, houve nova suspensão. O retorno ocorreu no fim de abril.

Marinalva, que também tem outros projetos para pessoas com síndrome de Down, comemora a evolução do projeto. Neste sábado, 3, haverá a entrega dos uniformes da equipe. Participarão do evento o técnico da Seleção Brasileira de Futsal Down, o coordenador técnico da CBDI (Confederação Brasileira de Desportos para Deficientes Intelectuais), Cleiton Monteiro, o coordenador do S21 Ponte Preta futsal Down, Maurício Carlos, o técnico da equipe campineira, Peixotão, e fotógrafo do time Marcos Ribolli.

– Venho em todos os treinos. Você vê como cada um chegou, como o filho fala do futsal, como fica aguardando pelo dia para treinar. Isso mexe com a criança. O estimulo psicológico conta muito. É muito nítido que aqui em quadra, eles não fazem forçado. Fazem com alegria. É diferente de uma sala de terapia, que a gente leva, que é individual para desenvolver uma certa habilidade. Aqui é muito diferente de uma sala de terapia. Eles estão fazendo todos juntos o mesmo exercício, isso achei muito eficaz. Na sala de fisioterapia, a Sofia tem preguiça de fazer tudo e não quer fazer. Aqui, ela não tem essa resistência, porque tem as outras fazendo igual, o mesmo exercício. É tudo – destacou Marinalva.

 Danilo Sardinha

Criança da equipe de São José dos Campos. Foto: Danilo Sardinha